Brasil não reduziu mortes no trânsito

25/05/2021 às 10:19 am

País ficou longe de cumprir a meta estabelecida pela Organização Mundial de Saúde de reduzir em 50% o número de óbitos e feridos no trânsito das ruas e estradas.

O Brasil ficou longe de cumprir a meta da Organização Mundial de Saúde de reduzir em 50% o número de mortes em acidentes de trânsito de 2009 a 2019. Considerando apenas as rodovias, o País teve diminuição nos óbitos de pouco mais da metade desse objetivo, apesar da queda registrada, sobretudo depois da promulgação da Lei Seca, da obrigatoriedade do uso de cadeirinha para as crianças e da exigência do exame toxicológico para veículos pesados. Um novo mapeamento feito pela agência 360º para a Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), com base em dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF), revela que entre 2009 e 2019 foram relatados nas estradas federais 1.507.645 de acidentes e 79.085 mortes. Dados preliminares de 2020 indicam pelo menos 5,3 mil mortos, apesar da redução de tráfego causada pela pandemia. “Embora o número de acidentes tenha caído significativamente, se pudéssemos aplicar a meta da ONU só às estradas, ainda assim o Brasil estaria em desvantagem. Conseguimos baixar apenas 26% das mortes nas rodovias“, afirmou o diretor científico da Abramet, Flávio Adura. “Projetando a expectativa da ONU, era de se esperar que o número de vítimas não ultrapassasse 3,6 mil.”

Causas – As principais causas de fatalidades são evitáveis. “Observamos redução consistente do número de mortos”, admite Adura. “Mas o Brasil continua sendo o quarto país do mundo com o maior número absoluto de mortes, atrás só de China, Índia e Nigéria. Nos chamados países em desenvolvimento as ocorrências com mortes são muito mais prevalentes. Isso ocorre porque pelo menos metade da mortalidade vem dos chamados ‘vulneráveis do trânsito’: pedestres, motociclistas e ciclistas.” Entre as maiores vítimas estão as crianças. Os sinistros de trânsito são a principal causa de morte de 0 a 14 anos.

Riscos – O mapeamento se divide em dois momentos. Entre 2009 e 2014, houve, em média, 180 mil sinistros por ano. Entre 2015 e 2019, ficou em torno de 86 mil casos anuais, em média. No topo da lista das causas aparece a falta de atenção. Fator que envolve múltiplas razões indefinidas. “Motoristas dirigem distraídos, conversando, vendo a paisagem e, muitas vezes, falando no celular e mandando mensagens. Mas a falta de atenção também pode estar relacionada a doenças e ao uso de medicamentos que podem causar sedação ou sonolência. Problemas cognitivos, como o Alzheimer, também podem provocar falta de atenção. Sem falar no uso de drogas para viagens mais longas (sobretudo entre motoristas profissionais)”, pontua Adura. Na segunda posição está a velocidade excessiva para determinados trechos, com 9,4% dos registros. Outro problema frequente é o excesso de velocidade. “Trabalhos científicos sobre a tolerância humana a impactos mostram que em um acidente envolvendo um veículo viajando a até 30 km/h a chance de sobrevivência dos envolvidos em atropelamento ou colisão é de praticamente 100%“, explica o presidente da Abramet, Antonio Meira Jr. “Mas a partir de 50 km/h, a chance de um vulnerável (pedestre, motociclista ou ciclista) morrer é de 100%.” O álcool surge numa categoria à parte. Sua ingestão, conforme a OMS, é causa de até 35% dos acidentes mais graves. São as ocorrências que deixam mais mortos e mais pessoas com sequelas graves. “Não é só uma questão de perder os reflexos, o que já seria grave“, explica Adura. “O álcool, assim como outras drogas, interfere na direção, na perda da noção de velocidade, na perda da visão lateral. Além disso, torna a pessoa mais agressiva. Em um acidente, aqueles que estão alcoolizados são sempre os que têm mais chances de morrer, seja pela própria reação no momento do acidente, seja depois, no hospital, pelas condições médicas.” Presidente da Associação Brasileira de Psicologia de Tráfego, Patrícia Sandri complementa, ressaltando que “até 90% dos acidentes são causados por falhas humanas“, diz. Uma forma complementar de evitar os efeitos mais graves dessas falhas, segundo o presidente da Abramet, seria ter estradas inteligentes, como algumas da Europa. “Já sabemos que todo ser humano comete erros. Então deveríamos projetar as vias pensando nessa possibilidade, como na Suécia”, diz Meira Jr. “As estradas brasileiras são péssimas, mal planejadas, têm sinalização inadequada, iluminação insuficiente e são mal conservadas.” Outro achado relevante da investigação científica foi o delineamento de uma lista de rodovias com maior concentração de acidentes e a definição de pontos críticos em termos de segurança para motoristas, passageiros e pedestres. Em números absolutos, as dez rodovias com mais acidentes foram: BR-101, BR-116, BR-381, BR-040, BR-153, BR-364, BR-262, BR-316, BR-163 e BR-230. Nessas, houve 926.676 incidentes.

Pandemia – Dados do Sistema Único de Saúde (SUS) indicam o oposto do que se esperava com a pandemia de 2020: uma redução mínima da violência no trânsito. Em 2019, o número de pessoas que sofreu acidente de carro e foi levado ao hospital foi de 219.449. Em 2020, foram 212.058, retração de 3%. A tendência se confirma nos gastos do SUS com o atendimento a acidentados. Foi de R$ 313.445.848 em 2019 para R$ 311.936.574 no ano passado. “No primeiro momento da pandemia, houve uma redução dos acidentes“, avalia Flávio Adura da Abramet. “Mas logo depois começou a aumentar novamente, sobretudo com a grande circulação de motocicletas de entrega, mais sujeitas a acidentes.”

Mudanças com a nova Legislação – A nova legislação que entrou em vigor em 12 de abril não é exatamente a que os defensores de um trânsito mais seguro esperavam. “Foi a lei possível de ser aprovada no Congresso“, diz Armando de Souza, presidente da Comissão Especial de Direito do Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil. Muitos Especialistas criticam vários pontos. Agora as habilitações para a condução veicular passam a valer por 10 anos para condutores de até 50 anos – e não mais por 5 anos. Pela lei anterior, o motorista podia acumular só até 20 pontos na CNH para não ter a carteira suspensa. A partir de agora, contudo, há uma gradação e a perda ocorre com 20, 30 ou 40 pontos. E com a nova lei quem for flagrado dirigindo em uma velocidade acima de 50% do limite permitido pela via não terá mais a suspensão e a apreensão imediata da CNH. Haverá processo administrativo. Mas também houve avanços. Antes de o texto chegar à Câmara, havia a intenção de não penalizar pelo não uso da cadeirinha ou assento de elevação para bebês e crianças. Contudo, a obrigatoriedade foi mantida. O que mudou foi o limite de altura para utilização dos dispositivos de segurança. Crianças de 1,45 metro de até 10 anos devem usar o dispositivo de retenção por lei. Pela lei anterior não havia limite de altura. Outro avanço é a determinação de que motos, ciclomotores e motonetas só podem transportar crianças com mais de 10 anos. Pela lei anterior, eram 6 anos. A nova lei impede que ocorra a substituição da prisão por penas alternativas aos condutores que, sob efeito de álcool ou substâncias psicoativas, causarem morte ou lesão corporal. O Exame toxicológico que era exigido desde 2016, por sua vez, carecia de penalidade pelo seu não cumprimento. Essa falha foi corrigida, com a introdução de artigo que prevê a necessidade de comprovar resultado negativo. Além disso um novo artigo foi criado (Artigo 165-B) determinando que motoristas que dirigirem veículos de categoria C, D ou E sem estarem com o exame toxicológico negativo em dia serão autuados. A infração é de natureza gravíssima e vai deixar o motorista com seu direito de dirigir suspenso por 3 meses, além de gerar multa multiplicada por cinco, somando R$ 1.467,35.

Fonte: Portal Terra

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