A chance da Prevenção

14/01/2022 às 4:40 pm

Ainda é muito cedo para conhecer o resultado das estatísticas de sinistralidades no trânsito brasileiro no ano passado, mas alguma coisa já pode ser antecipada com boa dose de certeza. Quero me referir sobre o número de vítimas fatais de sinistros que ficaram pelo caminho em 2021 em razão da imprudência, imperícia, inconsequência, distração ou mesmo irresponsabilidade. Estes brasileiros, aparentemente, não fizeram da segurança um valor e não deram a devida importância para a prevenção de sinistros. Isto não é novo no Brasil, mas é bom que seja revisto para o sucesso da prevenção futura no nosso país. É inegável que o Brasil conseguiu melhorar seus indicadores de segurança no trânsito nas últimas décadas, mas não é menos verdade que o gerenciamento de risco do brasileiro médio é muito incipiente, o que explica tantos sinistros e tanta dor. Não é admissível que continuemos assim.

Não há nada mais importante no trânsito brasileiro do que evitar a morte de cerca de 30 mil pessoas e centenas de milhares de feridos ou sequelados por ano. Contudo, sistematicamente, temos visto o aparelho governamental – Senatran, Detrans, secretarias municipais de trânsito, apresentando novidades tecnológicas bastante desenvolvidas para melhorar o fluxo do trânsito, a burocracia das repartições, facilitando em muito a vida dos cidadãos, mas a prevenção de sinistros parece caminhar a passos de tartarugas. É claro que mudar o comportamento humano não é fácil e este tem sido o desafio de praticamente todos os países. Contudo, o que se percebe é que os investimentos brasileiros na prevenção de sinistros de trânsito continuam perdendo feio o jogo para as fatalidades. É preciso dizer mais que isto não é uma questão apenas econômico-financeira, embora possa ter seu peso específico.

Países ricos têm obtido melhores resultados pois, além de investirem na prevenção, contam com melhores níveis de educação básica de suas populações. Contudo, a realidade dos nossos vizinhos da América do Sul não é muito diferente da nossa e, no entanto, seus índices são melhores. O que nos falta, no Brasil, é determinação – vontade política – para atacar o grande problema dos índices de fatalidades nas suas raízes mais conhecidas: a falta de educação no trânsito e a negligência na prevenção dos sinistros. Sabemos há muito como estes desafios são enfrentados noutros países, notadamente nos mais adiantados: educação numa ponta e repressão na outra. Esta é a receita dos países que lideram o ranking mundial.

É óbvio que quando se fala de educação para o trânsito, estamos incluindo todo o sistema escolar brasileiro, mas não apenas ele: universidades, empresas, entidades, sindicatos, centros de formação profissional, há toda uma lista de setores que devem ser incluídos num grande esforço nacional pela mudança de comportamento. Além disso, como se já não fosse bastante, é indispensável um amplo programa de comunicação sobre segurança no trânsito para atravessar uma década inteira e cobrindo todos os segmentos da nossa sociedade.

Não se trata de um “ambicioso” projeto, com custos inimagináveis ou impossíveis para os nossos padrões. Um programa desse pode ter seus custos compartilhados entre vários parceiros, principalmente a iniciativa privada, uma grande perdedora neste jogo macabro pois muitos de seus colaboradores são levados pelos “acidentes” que se repetem aos milhares nos quatro cantos do país. Pode-se alegar várias razões para não trabalhar mais firme por um comportamento seguro da nossa gente, mas não nunca falta de recursos.

Estamos entrando no segundo ano da segunda década mundial de trânsito e temos boas chances de “fazer bonito” em 2030, mas precisamos agir rápido e de maneira planejada. Tenho mencionado a esperança (moderada) de que o Pnatrans decole para valer e possa produzir bons resultados imediatamente para que haja mais entusiasmo e incentivo para seguir firme em frente. Sendo este um ano de eleições, ele pode ser decisivo para o sucesso do grande projeto de prevenção de sinistros de trânsito.

Estamos, assim, diante de uma oportunidade única. O que a sociedade – nós – vai exigir dos candidatos? Que tipo de trânsito queremos para nós e, principalmente para nossos filhos e netos? Se não formos nós, que mostramos preocupação com a violência do trânsito, quem se se preocupará com ele?

Pedro Correa é consultor em programas de segurança no trânsito

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