Estatísticas de trânsito estão contaminadas

15/06/2020 às 7:40 am

Há muito tempo que tentamos saber quantas pessoas morrem todos os anos no trânsito brasileiro, quantas ficam com invalidez permanente ou simplesmente feridas. Talvez, agora que a imprensa está tão focada em saber os dados precisos da Covid-19, passada a pandemia, possamos ter acesso a esses números para saber a situação real da epidemia da violência no trânsito.

Atualmente, temos muitas especulações, mas nenhum número é preciso. No site do Departamento Nacional de Trânsito há anos que não consta nenhuma informação sobre acidentes, mortos e feridos. O Ministério da Saúde, pr sua vez, também não dá destaque ao tema. A melhor fonte para entender as tendências dessas tragédias de nosso cotidiano é o Relatório Anual do DPVAT, o seguro obrigatório pago por todos os proprietários de veículos, produxido pela Seguradora Lider. Entretanto, os números não representam apenas os acidentes ocorridos naquele ano. Isto porque o benefício pode ser utilizado até 3 anos após o acidente e a apuração dos números leva isso em conta.

Números de guerra

Nós podemos estimar, pelos dados do DPVAT, que pelo menos 40 mil pessoas morreram em 2019, mais de 230 mil ficaram com invalidez permanente e praticamente 80 mil receberam indenização por despesas médicas. Entretanto, quando comparamos a média de mortos por feridos com a de outros países a situação complica. Nos EUA e Espanha a média de feridos por mortos é de 70 pessoas. No Brasil o número mais confiável, ainda que com restrições, é o da Polícia Rodoviária Federal, onde a média de feridos por mortos foi de 15 em 2019.

Quase cinco vezes menos. Indício claro de subnotificação das ocorrências. Afinal, a nossa frota é antiga, com menos itens de segurança disponíveis nos veículos que pudessem justificar a redução de feridos nos acidentes. Mas não para por aí, em 2014 foram registradas nas rodovias federais 169.195 acidentes, com 368.500 pessoas envolvidas. Em 2015 os acidentes diminuíram de forma inexplicável para 122.007 e as pessoas envolvidas para 268.733, quase 100 mil a menos.

Mudou a metodologia

Essa redução não foi fruto de um trabalho extraordinário nas estradas federais mas sim de uma significativa mudança de metodologia da instituição que deixou por conta dos envolvidos em acidentes sem vítimas nas rodovias federais, a iniciativa de informar a ocorrência. Não é preciso ser um especialista para saber que um motorista embriagado, que saiu da pista e ficou ferido levemente, não vai espontaneamente  informar a PRF do acontecido. Isto explica em parte porque a redução de acidentes, de repente, foi de 28%.

Portanto, torcemos para que a grande mídia, a partir deste ano, passe a exigir com o mesmo empenho que faz quanto a Covid-19, que as autoridades informem o total de vítimas da violência no trânsito. Afinal, caso a proporção de feridos por mortos no Brasil seja semelhante a americana ou espanhola, podemos estimar 2,8 milhões de feridos anualmente no trânsito brasileiro e não pouco mais de 600 mil como os números atuais parecem indicar. No momento, temos certeza de que nossas estatísticas de trânsito tem o vírus da falta de credibilidade.

Rodolfo Rizzotto – Coordenador do SOS Estradas

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