Nova SENATRAN

20/09/2021 às 10:56 am

Quem quer segurança? E o que fazemos para consegui-la?

Confesso que esperava maior repercussão sobre a promoção do Denatran à condição de Secretaria Nacional de Trânsito. A partir do meu acompanhamento da imprensa brasileira, a sensação que tive foi de uma reação “média”. Na mídia social, especialmente nos sites que têm no trânsito um dos seus temas principais, a repercussão não chegou a morna. Se isto for verdade, reflete muito bem a importância que o país dá ao trânsito e ao seu desenvolvimento. Claro, se tivéssemos tido uma semana de grandes engarrafamentos nas principais cidades, não há dúvidas de que a cobertura ocuparia as primeiras páginas dos jornais e as aberturas dos nossos principais telejornais. Como se tratou da promoção de um órgão de 4º nível na escala hierárquica do Governo, pode-se considerar o tratamento jornalístico como “adequado”. A pergunta que fica no ar é o que pode fazer a nova Senatran para atrair maior interesse da sociedade e buscar um papel de representação à altura do potencial que pode efetivamente desempenhar. Vai ser um desafio tirar da cartola tantos coelhos quantos precisaria para este seu show de mágica. Sabe-se que sua equipe será ampliada, mas é impensável que venha a ter, num espaço de tempo relativamente curto, um time de técnicos de alto nível para atender a expectativa nacional nas várias áreas especializadas. Oxalá o status de Secretaria possa lhe trazer a autoridade indispensável no relacionamento com os órgãos estaduais, notadamente os Detrans e, principalmente dos municípios que é, de fato, onde o trânsito acontece. Se os municípios comprarem a ideia de que se inicia agora uma nova e promissora fase na história do trânsito do país e a Senatran, mesmo a médio prazo, tiver condições de mostrar que pode atender a esta expectativa, julgo que temos bons motivos a comemorar. Este seria o tempo de se estruturar, atrair pessoal qualificado e colocar em prática o conjunto de planos que deve ter em suas gavetas. Obviamente com recursos adequados, promessas que não fazem parte destas primeiras decisões. O que a Senatran faz agora é vender promessas de dias melhores em todas as áreas. Todos sabemos que o sistema de trânsito brasileiro é um enorme mosaico, um conjunto sem fim de planos de ações ou mesmo de sonhos, que precisam ser acoplados uns aos outros ao longo dos tempos para formar uma peça única, exemplar. Assim, tenhamos paciência pois não vivemos num país que valoriza o trânsito e esperar por investimentos pesados nesta área como é preciso não parece ser algo realista.

A quem interessa? – Quando falei da reação modesta da imprensa nacional à promoção do Denatran e da repercussão morna da sociedade, quero levantar uma questão chave: afinal, quem quer segurança neste país? Se ousarmos dizer que a sociedade quer (e tenho a convicção de que, sim) a pergunta subsequente é: e o que fazemos para consegui-la? No mesmo momento em que a população, atônita, assiste ao governo preocupado em armar seus cidadãos, anúncios de automóveis continuam vendendo velocidade e potência. Diante deste quadro, não há porque se surpreender que a chegada da Senatran não tenha provocado maiores reações. Há anos, numa palestra no interior de São Paulo, uma professora me perguntou porque a TV continuava a anunciar modelos de carros de iam de zero a dez em poucos segundos e chegavam a 200 km/h. E eu respondi “porque (parte da) sociedade aceita, tem quem compre! ” Se a sociedade rejeitasse fortemente este tipo de anúncio, certamente ele sairia do ar e as montadoras passariam a vender outros atributos. Sinto que a população não sabe da força que tem e do quanto poderia influenciar os governos em todos os níveis. Se soubesse como fazer pressão, exigir seus direitos, exigir melhor representação por parte dos políticos que elegeu, ninguém duvida de que já teríamos avançado muito mais neste país. Por isso, precisamos mostrar às nossas lideranças que tipo de trânsito queremos hoje e principalmente o que queremos deixar para nossos filhos e netos. Nosso legado precisa ser definido a partir de agora. Se o papel dos políticos e das lideranças é essencial, temos de ter consciência de que cabe a nós, como sociedade, acioná-los ou melhor pressioná-los para tanto. É isto que se espera em uma democracia.  Senatran ou Denatran não vai mudar nada na vida dos brasileiros se não for alterada a estrutura que o órgão possui para poder oferecer as respostas e os benefícios que a sociedade precisa. Por isso precisamos valorizar a promoção mas, ao mesmo tempo, exigir da Senatran a resposta que nos promete dar.

JPedro Corrêa – Consultor em programas de segurança no trânsito

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